quarta-feira, 21 de junho de 2017

Consciência pesada

Acordei quando o relógio marcava 7h30 da manhã. O dia mal tinha começado para mim e já me culpei por não ter atendido ao primeiro disparo sonoro do alarme. Se tivesse acordado meia hora antes, tomaria banho com mais tranquilidade.




No café da manhã, tomei uma xícara de achocolatado e comprei um pão de queijo bem generoso. No mesmo instante, senti aquela onda de arrependimento me corroer internamente. Eu deveria ter escolhido um chá ou um suco com pão integral.  Tinha total consciência disso, mas novamente não segui as regras. 
Em menos de uma hora, contabilizei duas frustrações. Durante o caminho para o trabalho, ativei os dados do celular e recebi uma sequência de 20 mensagens em um grupo do whatsapp. Era tanta coisa para ler. Com preguiça, deixei para depois. Agora somavam três pesos sobre os meus ombros.
No meio do expediente, recebo uma ligação de uma amiga, convidando-me para uma festa de aniversário. No fundo, estava morrendo de vontade de ir, mas tinha tanta coisa para fazer. Entre os dois compromissos, optei pelo segundo. Não podia sair para me divertir com tanta pendência a resolver.
Ao longo do dia, neguei convites para almoço, passeios em parques, cafés em família, jantares com os amigos. Continuei no escritório finalizando meus compromissos. Permaneci priorizando aquilo que julgava ser o mais importante, pelo menos naquele momento. Quase no fim do dia, desmarquei a massagem, mesmo sabendo que me arrependeria assim que as dores no pescoço voltassem.
Ao chegar em casa, sentei no sofá e liguei a TV. Deveria ter corrido 30 minutos na esteira. Afinal de contas, foi por esse motivo que comprei aquele aparelho gigantesco. Não corri, não me exercitei, permaneci imóvel assistindo programas de entretenimento. O saldo negativo só aumentava.
Mesmo exausta, procurei uma roupa no armário para ir à Universidade. Ainda que houvesse pilhas e pilhas de peças na minha frente, nada parecia me agradar. Era preciso comprar algo mais atual, mais de acordo com os padrões da moda. Tudo estava muito desatualizado.
Entrei na sala de aula, super cansada, sentido-me feia pelas roupas que escolhi. Apesar de estar copiando o conteúdo, minha cabeça estava distante pensando nas renúncias que havia feito. Quantos arrependimentos em um único dia.
Retornei para casa, coloquei o pijama e me deitei. Antes de dormir, porém, me condenei pelas minhas atitudes. Sabia que deveria trabalhar menos, estudar menos e viver mais. Na minha rotina, não havia espaço para lazer e diversão. Não havia espaço para saúde e bem-estar. 
Vivia cumprindo metas, seguindo regras, tentando alcançar o inalcançável. Buscava incansavelmente a perfeição. Não tinha como ser, ao mesmo tempo, uma ótima profissional, uma ótima amiga, uma ótima dona de casa, uma ótima esposa. Não tinha como ser a melhor em todas as disciplinas. Era impossível. Mas, involuntariamente, transformava isso em uma meta diária.
Não foram raras as vezes que neguei convites para sair ou assistir a um filme no cinema. Sempre tinha algo mais urgente para fazer e, na maioria das vezes, esta urgência traduzia-se em trabalho. Adiei matrículas em academias, cursos de música, idas à shows e teatros. Na minha vida, a prioridade sempre foi estudar e ser a melhor.
Embora tenha dedicado anos da minha vida me esforçando para atingir esse objetivo, nem sempre conquistava o almejado. Era justamente nesses momentos que eu me questionava: será que valeu a pena?
Jamais vamos atingir a perfeição. Este mundo globalizado e, acima de tudo, conectado, apenas ajudou a propagar uma falsa felicidade. Buscamos constantemente ser aquele modelo idealizado nas redes sociais. Queremos ser bem sucedidos profissionalmente, queremos ter as melhores roupas, os melhores carros, as melhores notas na Universidade. Queremos dar conta de todos os compromissos profissionais e pessoais. Queremos ser melhor mãe, melhor profissional, melhor esposa, melhor amiga, melhor aluna.
Mas será que essa conta é exata no final? Ficar se condenando o dia inteiro pelas renúncias não faz você melhor, muito menos, feliz. As vezes é melhor perder alguns pontinhos em algumas situações, para ganhar em outras mais especiais. Talvez você não seja a melhor, mas consiga ser tão boa quanto. É preciso balancear, equilibrar essa conta para que ao final o saldo seja positivo.
A vida exposta nas redes sociais não representa nem de perto a verdade. Ninguém é feliz o tempo todo. Muito pelo contrário, algumas pessoas preferem mascarar sua infelicidade divulgando fotos e textos para suprir a carência que sentem interiormente. Os melhores momentos da vida não estão registrados em fotografias, pois, provavelmente, a situação nos consumiu tanto ao ponto de sequer lembrarmos de fotografar. Quando a felicidade é plena não precisamos compartilhá-la, precisamos apenas senti-la.
Não fui na academia, não comi geleia light, não participei do aniversário da amiga. Não tomei café na casa dos avós, não assisti aquele filme que tanto queria. Pelo contrário, gastei todo tempo ocupada demais com textos, livros e relatórios. Renunciei não apenas a estes momentos, mas a tantos outros. Renunciei a minha felicidade, renunciei a minha vida.
Em meio a tantos nãos, percebi que era chegada a hora de dizer SIM. Depois de tantas renúncias, notei a necessidade de aceitar, ponderar, consentir. Não precisava me condenar, por não ter seguido padrões que nem sequer sei que inventou. Posso definir as minhas próprias regras, sem me julgar por isso. Posso comer aquilo que tenho vontade, vestir o que me faz bem, malhar quando estiver preparada. Que mal tem nisso? Não preciso fazer tudo ao mesmo tempo. Aliás, não consigo fazer tudo ao mesmo tempo. 
Aos poucos, vou invertendo esse saldo negativo. Tenho certeza que, com o tempo, os pesos na consciência vão diminuir e, assim, vou estabelecendo um equilíbrio positivo. Prefiro que os pesos na consciência sejam pelo excesso de momentos felizes. Para mim, essa é a conta mais exata no cálculo da vida.

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