Acordei quando o
relógio marcava 7h30 da manhã. O dia mal tinha começado para mim e já me culpei
por não ter atendido ao primeiro disparo sonoro do alarme. Se tivesse acordado
meia hora antes, tomaria banho com mais tranquilidade.
No
café da manhã, tomei uma xícara de achocolatado e comprei um pão de queijo bem
generoso. No mesmo instante, senti aquela onda de arrependimento me corroer
internamente. Eu deveria ter escolhido um chá ou um suco com pão integral.
Tinha total consciência disso, mas novamente não segui as regras.
Em
menos de uma hora, contabilizei duas frustrações. Durante o caminho para o
trabalho, ativei os dados do celular e recebi uma sequência de 20 mensagens em
um grupo do whatsapp. Era tanta coisa para ler. Com preguiça, deixei para
depois. Agora somavam três pesos
sobre os meus ombros.
No
meio do expediente, recebo uma ligação de uma amiga, convidando-me para uma
festa de aniversário. No fundo, estava morrendo de vontade de ir, mas tinha
tanta coisa para fazer. Entre os dois compromissos, optei pelo segundo. Não
podia sair para me divertir com tanta pendência a resolver.
Ao
longo do dia, neguei convites para almoço, passeios em parques, cafés em
família, jantares com os amigos. Continuei no escritório finalizando meus
compromissos. Permaneci priorizando aquilo que julgava ser o mais importante,
pelo menos naquele momento. Quase no fim do dia, desmarquei a massagem, mesmo
sabendo que me arrependeria assim que as dores no pescoço voltassem.
Ao
chegar em casa, sentei no sofá e liguei a TV. Deveria ter corrido 30 minutos na
esteira. Afinal de contas, foi por esse motivo que comprei aquele aparelho
gigantesco. Não corri, não me exercitei, permaneci imóvel assistindo programas
de entretenimento. O saldo negativo só aumentava.
Mesmo
exausta, procurei uma roupa no armário para ir à Universidade. Ainda que
houvesse pilhas e pilhas de peças na minha frente, nada parecia me agradar. Era
preciso comprar algo mais atual, mais de acordo com os padrões da moda. Tudo
estava muito desatualizado.
Entrei
na sala de aula, super cansada, sentido-me feia pelas roupas que escolhi.
Apesar de estar copiando o conteúdo, minha cabeça estava distante pensando nas
renúncias que havia feito. Quantos arrependimentos em um único dia.
Retornei
para casa, coloquei o pijama e me deitei. Antes de dormir, porém, me condenei
pelas minhas atitudes. Sabia que deveria trabalhar menos, estudar menos e viver
mais. Na minha rotina, não havia espaço para lazer e diversão. Não havia espaço
para saúde e bem-estar.
Vivia
cumprindo metas, seguindo regras, tentando alcançar o inalcançável. Buscava
incansavelmente a perfeição. Não tinha como ser, ao mesmo tempo, uma ótima
profissional, uma ótima amiga, uma ótima dona de casa, uma ótima esposa. Não
tinha como ser a melhor em todas as disciplinas. Era impossível. Mas,
involuntariamente, transformava isso em uma meta diária.
Não
foram raras as vezes que neguei convites para sair ou assistir a um filme no
cinema. Sempre tinha algo mais urgente para fazer e, na maioria das vezes, esta
urgência traduzia-se em trabalho. Adiei matrículas em academias, cursos de
música, idas à shows e teatros. Na minha vida, a prioridade sempre foi
estudar e ser a melhor.
Embora
tenha dedicado anos da minha vida me esforçando para atingir esse objetivo, nem
sempre conquistava o almejado. Era justamente nesses momentos que eu me
questionava: será que valeu a pena?
Jamais
vamos atingir a perfeição. Este mundo globalizado e, acima de tudo, conectado,
apenas ajudou a propagar uma falsa felicidade. Buscamos constantemente ser
aquele modelo idealizado nas redes sociais. Queremos ser bem sucedidos
profissionalmente, queremos ter as melhores roupas, os melhores carros, as
melhores notas na Universidade. Queremos dar conta de todos os compromissos
profissionais e pessoais. Queremos ser melhor mãe, melhor profissional, melhor
esposa, melhor amiga, melhor aluna.
Mas
será que essa conta é exata no final? Ficar se condenando o dia inteiro pelas
renúncias não faz você melhor, muito menos, feliz. As vezes é melhor perder
alguns pontinhos em algumas situações, para ganhar em outras mais especiais.
Talvez você não seja a melhor, mas consiga ser tão boa quanto. É preciso
balancear, equilibrar essa conta para que ao final o saldo seja positivo.
A
vida exposta nas redes sociais não representa nem de perto a verdade. Ninguém é
feliz o tempo todo. Muito pelo contrário, algumas pessoas preferem mascarar sua
infelicidade divulgando fotos e textos para suprir a carência que sentem
interiormente. Os melhores momentos da vida não estão registrados em
fotografias, pois, provavelmente, a situação nos consumiu tanto ao ponto de
sequer lembrarmos de fotografar. Quando a felicidade é plena não precisamos
compartilhá-la, precisamos apenas senti-la.
Não
fui na academia, não comi geleia light, não participei do aniversário da amiga.
Não tomei café na casa dos avós, não assisti aquele filme que tanto queria.
Pelo contrário, gastei todo tempo ocupada demais com textos, livros e
relatórios. Renunciei não apenas a estes momentos, mas a tantos outros.
Renunciei a minha felicidade, renunciei a minha vida.
Em meio a tantos nãos, percebi que era
chegada a hora de dizer SIM. Depois de tantas renúncias, notei a necessidade de
aceitar, ponderar, consentir. Não precisava me condenar, por não ter seguido
padrões que nem sequer sei que inventou. Posso definir as minhas próprias
regras, sem me julgar por isso. Posso comer aquilo que tenho vontade, vestir o
que me faz bem, malhar quando estiver preparada. Que mal tem nisso? Não preciso
fazer tudo ao mesmo tempo. Aliás, não consigo fazer tudo ao mesmo tempo.
Aos poucos, vou invertendo esse saldo negativo. Tenho certeza que,
com o tempo, os pesos na consciência vão diminuir e, assim, vou estabelecendo
um equilíbrio positivo. Prefiro que os pesos na consciência sejam pelo
excesso de momentos felizes. Para mim, essa é a conta mais exata no cálculo da
vida.
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