O ano era 2002. Eu, no auge dos meus 11 anos, devia estar fazendo
algo sem muita importância no quarto ou talvez na sala. Minha mãe, por sua vez,
provavelmente estava arrumando a casa ou começando o preparo do jantar. Mal
sabíamos que nossas vidas estavam prestes a sofrer uma grande mudança.
Tudo parecia calmo e realmente estava,
até ouvirmos meu pai nos chamando na garagem de casa. Pensei que ele tivesse
esquecido algo ou precisa-se de alguma ajuda. Mas, eu estava errada em minhas
suposições. Meu pai continuou a gritar lá no andar de baixo. Depois do segundo
chamado, tanto eu quanto minha mãe abandonamos as nossas funções, para
descobrir o que ele queria de fato.
Eu fui a primeira a chegar. Enquanto descia as escadas, percebi uma movimentação estranha. Meu pai se divertia com alguma coisa que eu ainda não tinha conseguido identificar. Foi então que eu o vi pela primeira vez. Mesmo depois de tanto tempo ainda consigo lembrar exatamente da emoção daquele momento. Eram tantas sensações. Medo pelo novo, felicidade pela surpresa e insegurança pela responsabilidade que eu estava prestes a adquirir.
Enquanto eu ainda absorvia aquela novidade, percebi minha mãe chegar no alto da escada. No primeiro instante, ficou assustada e começou a xingar meu pai por ter feito aquilo. Pouco tempo depois, já estava encantada com aquele pequeno.
Foi assim que o Duck, um vira-lata de apenas dois meses, entrou em nossas vidas. Depois do impacto da descoberta, meu pai nos contou aonde encontrou aquele cãozinho simpático.
Tudo aconteceu quando ele, durante uma de suas vistorias de imóveis, se deparou com um monte de filhotinhos de cachorro na casa ao lado da qual estava trabalhando. O vizinho reparou o olhar atento do meu pai e o chamou para ver de perto a ninhada. Na conversa, o homem contou que já havia doado boa parte dos filhotes, faltava apenas encontrar um lar para o último macho. Comovido, meu pai foi conhecer o tal cãozinho. Pequeno, frágil e cheio de energia. Esta foi a primeira impressão. O filhote era lindo com o pelo todo nas cores branco e preto.
O Duck, como viemos a chamá-lo mais tarde, cheirou os pés do intruso e manteve os olhinhos, que mais pareciam duas bolitas marrons, direto nele. Não preciso nem dizer que meu pai voltou para casa com ele no colo. O Duck finalmente tinha encontrado uma nova família. Tanto ele quanto nós, não sabíamos a maneira certa de proceder. Cada dia seria um grande aprendizado.
Conforme os anos foram passando, acabei me distanciando do Duck. Em plena a adolescência, sempre tinha algo mais importante para fazer do que visitar o cachorro. Meu pai e minha mãe sempre cuidaram dele, nunca lhe faltou nada. Mas ainda assim, o Duck ficava mais tempo sozinho do que acompanhado. Cheguei a passar um ano inteiro sem vê-lo e, para falar a verdade, naquela época isso não me incomodava. Acompanhei pouco o seu crescimento e hoje me arrependo amargamente por isso.
O Duck vivia em estacionamentos ou nas obras do meu pai. Sempre fiel e alegre com quem dedicava o mínimo do seu tempo a lhe fazer um carinho. No entanto, nem sempre as coisas foram fáceis. Certo dia, ele foi atacado por um enxame de abelhas. Como estava preso, sofreu várias picadas e quase não resistiu aos ferrões. Contrariando a todas as previsões do veterinário, o Duck se recuperou, ficando apenas com pequenas falhas no pelo. Isso sem contar os atropelamentos. Foram dois. O Duck sempre foi muito arteiro, adorava correr e pular. Mas toda essa disposição rendia, as vezes, alguns machucados.
No primeiro, ele quebrou
uma das patinhas e no segundo perdeu uma pequena parte da orelinha. Mesmo com
tantos acidentes, o Duck nunca desistiu de viver. Graças a Deus, ele não
ficou com nenhuma sequela.
Depois de algum tempo, fui amadurecendo e me reaproximando do Duck. Era como estivéssemos nos conhecendo pela primeira vez. Mesmo após tantos anos completamente afastada, o Duck me recebeu com muito amor e, para minha surpresa, sem nenhuma mágoa. Nunca me perdoei por ter perdido momentos tão importantes ao lado dele, por ter sido tão imatura quando ele mais precisou de mim. Sem dúvida, faria tudo diferente se fosse hoje. Porém, como não é possível voltar no tempo, decidi que a partir daquele momento eu seria a melhor companhia que o Duck poderia ter, faria com que esses anos juntos fossem os melhores e mais divertidos. Nunca mais abandonaria ele, porque ele nunca me abandonou.
Continuo cumprindo o meu plano. Em 2016, o Dudu (como chamo ele agora com mais intimidade) completa 14 anos e eu só tenho histórias felizes para contar. A alegria e o carinho que ele nos proporciona é tamanho que não cabe em palavras. O Duck nunca pediu nada em troca. Não importa se estamos tristes, doentes ou estressados com o trabalho, ele sempre está ao nosso lado. Sua energia positiva contagia qualquer um.
Hoje ele mora na nossa casa, exatamente na mesma garagem que um dia ele apareceu pela primeira vez. Só que agora, ele tem dois sofás para dormir, um monte de brinquedinhos e toda família em volta para mimá-lo.
O Duck mudou as nossas vidas, coloriu os nossos dias, trouxe mais amor ao nosso lar. Com o seu jeitinho alegre e divertido conquistou cada um de nós. Hoje ele é muito mais do que um animal de estimação, o Duck faz parte da nossa família, da nossa história. Queria muito poder voltar atrás e aproveitar enquanto ele ainda era novinho, mas hoje percebo que esse erro do passado fez com que eu me tornasse alguém melhor. Aprendi a valorizar momentos, aprendi a importância de uma boa companhia, aprendi que existe amor verdadeiro e, acima de tudo, aprendi que existe perdão.
Apesar dos pelos branquinhos, da visão já embaçada, dos poucos dentes na boca e dos remédinhos para artrite, o Duck continua a todo vapor. Por vezes, penso se não erramos na idade dele (acreditem ele é terrível). O amor só aumenta. Não imagino mais minha vida sem o Duck, pois ele faz parte do eu que sou e da pessoa que me transformei.
Não gosto de dizer que sou dona do Duck, prefiro pensar que fomos adotados por ele. O Duck escolheu fazer a diferença na nossa família. Apesar de todas as dificuldades que ele enfrentou, sempre manteve o brilho nos olhos e o rabinho balançando quando nos aproximamos.
Se eu pudesse deixar apenas uma mensagem para quem dedicasse um pouco do seu tempo para ler esse texto eu diria com toda convicção dos meus agora 24 anos: tenham ao menos um animal de estimação. Eles mudam vidas, renovam energias e transmitem cargas diárias do mais puro e sincero amor. Os animais despertam o lado bom das pessoas. Fácil não é, muito menos barato, mas eles fazem tudo valer a pena.
Por fim, quero deixar registrado o meu amor e gratidão ao Duck. Jamais vou esquecer de tudo o que passamos juntos. Sorte a minha dos nossos caminhos terem se cruzado. Que Deus seja bem generoso e te conceda ainda muitos e muitos anos de vida ao nosso lado. Que tu encha nossa casa com muita luz e também com alguns pelos. Te amamos Dudu, obrigada simplesmente por existir.
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